é uma dor de cabeça

a história de hoje é um bocadinho mais longa, por isso começa com uma imagem:
é um calendário da minhas enxaquecas entre 2 de maio e 6 de junho de 2025.
estão indicados o tipo de dor de cabeça e os comprimidos tomados.

em 36 dias,
- 36 comprimidos;
- 10 dias sem comprimidos (são os dias marcados com uma malha retangular);
- 9 dias sem dores de cabeça;
- 1x 3 dias seguidos sem dor de cabeça;
- 1x 2 dias seguidos sem dor de cabeça;
- 5x 1 dia separado, sem dor de cabeça.

desde os meus 4 ou 5 anos que tenho dores de cabeça.

em criança, queixava-me frequentemente de sons à minha volta; pedia a quem estava comigo para falar mais baixinho; por vezes, sentia hipersensibilidade à luz. também sempre fui muito sensível aos cheiros, ao ponto de, por vezes, ficar muito incomodada com o perfume de quem passa, com o cheiro de tabaco de alguém a fumar no quarteirão a seguir. estava longe de perceber que estas hipersensibilidades poderiam ser causas ou sintomas de enxaquecas. as ligações que fazia entre estes fenómenos estranhos e as dores de cabeça que se lhes seguiam, eram por vezes apelidadas pelas pessoas à minha volta de “teorias da Marta”.

a primeira vez que senti mesmo que isto não era ‘normal’ foi depois de fazer uma direta na universidade, tinha 21 anos e estava em Erasmus, em Berlim. quando fui apresentar o trabalho, na manhã seguinte, estava de rastos (10min antes fui à casa de banho, com vontade de vomitar e não conseguia quase mexer a cabeça: parecia que ia explodir). aconteceu duas vezes nesse ano: exatamente nas duas apresentações finais dos semestres.

tive épocas com mais enxaquecas; outras, com menos. não faço ideia das razões.
fui acompanhada por um neurologista durante alguns dos anos que vivi em Berlim. pela primeira vez, tive acesso a medicamentos usados especificamente para enxaquecas - e que têm de ser tomados assim que parece que a enxaqueca está a aparecer, senão, não funcionam (e só resta esperar que a sra. dona enxaqueca se vá embora, quando lhe apetecer, apenas tentando aliviá-la de 8h em 8h com ibuprofeno 600). decidi não fazer um tratamento profilático que me propôs na altura, quando percebi que isso significava tomar medicamentos usados para pessoas com epilepsia…

um dia, depois de tomar um comprimido para a enxaqueca, aconteceu-me algo estranho: tentei passar um semáforo quando mudou para vermelho (a minha cabeça enganou-me: percebi que teria mudado para verde); a seguir, fui a uma padaria e pedi um bolo que não existia, juntando livremente o nome de dois bolos diferentes em um. e, para terminar, disse à pessoa que me tinha dado troco a mais (o que, como me explicou com muita paciência, não correspondia à verdade). assustei-me e deixei de tomar.

não há muitos medicamentos para enxaquecas e, no geral, existe muito pouca investigação sobre o tema (tendo em conta a incidência). o facto de que 75% das pessoas que sofrem de enxaquecas são mulheres talvez não contribua para que mais recursos sejam investidos na matéria.

uma enxaqueca não é só uma dor de cabeça.

antes de uma enxaqueca, pode haver um período de vários dias, em que as capacidades do cérebro estão mais fracas - ou diferentes, vá.
a enxaqueca em si, pode durar até três dias - e, neste tempo, não se consegue pensar, focar, seguir pensamentos, o humor vem por aí abaixo, só se quer sair de onde se está; não se aguenta mais ficar sem movimento (qualquer esforço pode aumentar a dor). qualquer coisa leva mais energia do que se pensa.
depois de um período de enxaqueca, é comum ficar-se uns dias em modo-cansaço, até retomar o funcionamento normal.

mas… o que é normal num mês como o deste calendário?

há cerca de um ano e uns meses, comecei a ter enxaquecas de mais de 50 horas. se começam hoje às 10h e acabam depois de amanhã às 12h, acabo por estar 2 dias e meio sem conseguir fazer grande coisa (para não dizer nada). fora os pré-sintomas (chamados de pródromo); e os pós-sintomas (pósdromo). são muitos dias seguidos de cérebro nublado. às vezes, só dá para esperar que passe; ainda por cima o tempo passa muito mais lentamente.

voltei a ser acompanhada por uma neurologista.:

- estou há quase 7 meses a tomar um medicamento profilático (sem ter notado qualquer melhoria), que calha ser também um anti-depressivo e me deixa mais parada; mais apática que o normal.

- quando sinto que está uma enxaqueca a começar, tomo um comprimido das enxaquecas, o que por vezes me deixa umas 4 a 6h com efeitos secundários não muito simpáticos e com uma sede constante, que me faz beber até 4l de água durante essas horas (com constante ida à casa de banho). às vezes resulta: não fico 3 dias inútil.

- também tomo uma série de ibuprofenos, a tentar minorar uma dor que está sempre lá. toda a gente me diz que ibuprofeno não faz bem.

.-.-.

há muitas coisas que podem originar uma enxaqueca: uma mudança de ritmo (ou horário) de dormir; mudanças na alimentação (ou algum alimento em específico); mudanças nas condições atmosféricas; stress…
cada pessoa é diferente. e demora a perceber o que fazer - e como fazer - e em que situações fazer o quê.

- há uns meses que uso um aparelho nos dentes enquanto durmo, para não cerrar os dentes (diz que pode fazer enxaquecas). não vejo melhorias, para já.

- esta semana vou fazer exames a ver se poderá ser alguma coisa na cervical (a médica acha que um dos tipos de dores poderá vir daí).

- diz que desporto é bom - e eu sei que é ! -, mas muitas vezes não consigo ir às aulas, porque… estou com enxaqueca (surpresa!).

estou há 3 dias com a cabeça meio-nublada; ainda não sei se vai desembocar em enxaqueca. não é lá muito fácil planear, quando não se sabe como vai ser. o paradoxo é que a enxaqueca prefere uma vida planeada mas, quando vem, desestabiliza e atrasa tudo. não gosta de stress, mas, quando vem, provoca ainda mais stress. o que pode provocar mais enxaquecas...

.-.-.

muitas vezes pensamos “era tão bom que o dia tivesse mais de 24h”.
eu só gostaria mesmo que cada dia tivesse as suas 24h; não era preciso mais.